Semanas pedagógicas na escola: uma questão de modismo educacional?

O projeto político-pedagógico escolar não deve ser encarado como uma simples representação do futuro

Marcos Pereira dos Santos (*)

Término das férias escolares. É hora de professores e alunos voltarem à escola para que possam dar início ou continuidade ao desenvolvimento de atividades educativas referentes aos processos de ensino e de aprendizagem no transcorrer do ano letivo.

Entretanto, são os docentes que primeiro marcam presença no espaço escolar; uma vez que antes mesmo do início das aulas propriamente dito já estão na escola participando da chamada “semana pedagógica” – atividade de cunho didático-pedagógico, prevista em calendário escolar, que se realiza a cada semestre letivo com o objetivo de possibilitar aos agentes escolares (professores, pedagogos, coordenadores pedagógicos, supervisores e orientadores educacionais, gestores escolares entre outros profissionais da área educacional) momentos de reflexão, debate e planejamento acerca das melhores formas de se pensar e fazer educação.

Trata-se, outrossim, de um momento de acolhida, confraternização e solidariedade mútua, onde dirigentes e dirigidos têm a oportunidade ímpar de repensar o passado e projetar o futuro da escola em termos de qualidade de ensino e aprendizagem almejados; seleção e utilização de diferentes recursos didático-pedagógicos (apostilas escolares, vídeos didáticos, filmes educativos, livros didáticos e paradidáticos, computadores etc.); formulação, aplicação e correção de avaliações escolares; uso de técnicas e metodologias de ensino; planejamento de aulas e planos de ensino; elaboração de atividades extraclasse (aulas-passeio, viagens, visitas técnicas, pesquisas de campo, estágios curriculares supervisionados entre outras); e proposição de palestras, cursos, minicursos, oficinas pedagógicas, semanas acadêmicas, grupos de estudos etc.; enfim, a tudo o que diz respeito ao processo educativo escolar em geral.

Todavia, todas essas questões devem, necessariamente, apresentar relação direta com o projeto político-pedagógico da escola, o qual se configura como uma espécie de documento-chave de valor legal a ser elaborado de forma coletiva e democrática a partir das concepções pedagógicas existentes, legislações educacionais subjacentes e opiniões expressas por todos os agentes escolares; no intuito de orientar/direcionar/nortear a organização e o desenvolvimento do trabalho a ser realizado por docentes e discentes no âmbito escolar.

Em outras palavras, isso significa dizer que “o projeto pedagógico consiste em uma proposta de curso que explicita a programação educativa, administrativa e pedagógica da escola” (FREITAS, 1999, p.7), ou seja, é a filosofia de trabalho da instituição escolar que deve ser conhecida, aceita e construída em conjunto por todos os agentes escolares envolvidos; a fim de que a mesma possa assim adquirir identidade própria, legitimidade e cientificidade. O projeto político-pedagógico escolar não deve ser encarado como uma simples representação do futuro, mas como um futuro a ser construído de forma cooperativa; uma ideia a ser transformada em ato, prática, ação, movimento.    

Para que isso ocorra, entendemos ser fundamental que o profissional pedagogo tenha uma atuação ativa e dinâmica na escola, de modo a sensibilizar e assessorar o corpo docente e a equipe técnico-administrativa para a construção de um projeto político-pedagógico que retrate realmente os compromissos da escola para com a educação, o ensino, a aprendizagem, a cultura e a sociedade; tendo em vista a formação de cidadãos responsáveis, críticos, reflexivos e conscientes de seus direitos e deveres. Daí a importância de as semanas pedagógicas não serem entendidas como um “modismo educacional”, uma tarefa burocrática, conforme nos apontam Rosso e Mafra (2000); mas como um espaço propício e oportuno para a discussão coletiva, o compartilhamento de experiências pedagógicas significativas, a tomada de decisões, a análise crítico-reflexiva e a melhoria da prática docente.

É preciso que vozes individuais se façam ouvir na coletividade, de modo que assim seja possível juntar forças internas com injunções externas para formar a verdadeira sinergia operativa rumo à construção democrática de projetos político-pedagógicos eficazes e eficientes, bem como ao desenvolvimento de semanas pedagógicas que venham contribuir efetivamente para o trabalho do professor em sala de aula e, consequentemente, para a conquista de uma educação de melhor qualidade.

Realizar semanas pedagógicas na escola apenas para cumprir carga horária de trabalho e atender a uma determinação da secretaria municipal ou estadual de educação de nada vale. Agir dessa forma é como “atirar no escuro”, não tendo “alvos”, objetivos previamente definidos; o que torna tal prática insossa e deveras ineficiente. Dizemos isso, porque corroboramos com Queiroz (2002) ao dizer que pensar e fazer educação é algo mais abrangente que ensino, aprendizagem, avaliação, estrutura e funcionamento da escola; haja vista que ela unifica a concepção de realidade e de realidade humana, a esperança em poder-se influenciar na efetivação dessas realidades e, mais, a convicção de que dentre as possibilidades dadas estão aquelas importantes para a edificação e manutenção da vida.    

Sem a pretensão de esgotar o assunto em pauta, faz-se profícuo destacar ainda que a gestão de mudanças significativas decorrentes de projetos pedagógicos articulados e coerentes consiste em uma atividade necessária e complexa que requer conhecimento profissional (não é coisa para amadores) e competência de ordem pessoal, técnica e política (não é algo para ditadores), especialmente em tempos marcados pela luta militante em prol da efetivação de uma gestão escolar democrático-participativa, colegiada. Trata-se de romper paradigmas tradicionais e abrir brechas para possíveis deslocamentos, possíveis redimensionamentos. Contudo, não podemos negar que estamos quase como peixes na piracema, subindo o rio contra a corrente para desovar e garantir a sobrevivência da espécie.

Levar em consideração esses fatores é tarefa imprescindível para a formação de sociedades cada vez mais justas, fraternas, solidárias, éticas, equânimes e verdadeiramente democráticas. Que a escola possa fornecer sua parcela de contribuição nesse sentido, já que “[...] no futebol fazem-se gols com as mãos, que as plateias aplaudem batendo os pés” (DE LA TAILLE, 1996, p.18). Pensemos a respeito!                 

Referências

DE LA TAILLE, Y. A indisciplina e o sentimento de vergonha. In: AQUINO, J. G. (Org.). A indisciplina na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, p.9-23, 1996.

FREITAS, L. P. Projeto pedagógico de curso: subsídios para elaboração e avaliação. Fortaleza: Editora da UNIFOR, 1999. (Coleção Temas Pedagógicos: Ensinando e Aprendendo – v.01).

ROSSO, A. J.; MAFRA, N. D. F. Entre o perene e o novo: a arte de compreender o modismo educacional. In: Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília: Editora da UnB, v.81, n.197, p.50-63, jan./abr., 2000.

QUEIROZ, R. Educação: uma conquista de todos os dias. Bauru: EDUSC; Brasília: INEP, 2002. (Coleção Educar).

 

prof-marcos-pereira web(*) Marcos Pereira dos Santos é doutorando em Ensino de Ciência e Tecnologia pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Escritor, poeta e cronista. Professor adjunto da Faculdade Sagrada Família (FASF), junto a cursos de graduação (bacharelado/licenciatura) e pós-graduação lato sensu, em Ponta Grossa/PR. Endereço eletrônico: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

 

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