Filosofia na vida e na escola: para que te quero?

A Filosofia tem a função precípua de contribuir para o desenvolvimento de valores

Marcos Pereira dos Santos (*)

Todas as pessoas possuem uma “filosofia de vida”, isto é, um modo particular de pensar-fazer a realidade concreta objetiva existencial; adotando, para tanto, uma postura de neutralidade ou de transformação perante a mesma. 

Como ciência milenar surgida na Grécia antiga, aproximadamente durante o século VI a. C., entre os filósofos gregos chamados “pré-socráticos” (pensadores que antecederam o filósofo grego Sócrates – 469-399 a. C.), a Filosofia (do grego philos = amor, amizade e sophia = saber, sabedoria) configura-se, de acordo com Prado Júnior (1984, p.6), como a “área do conhecimento que tem por objetivo principal efetuar indagações acerca da relação homem-sociedade, buscando assim ampliar incessantemente a compreensão da realidade concreta objetiva existencial para apreendê-la em sua totalidade”.

Estando subdividida em três ramos principais: ontologia – estudo do “ser” ou da existência humana; epistemologia – estudo do conhecimento; e ética (do grego êthos = virtude, caráter, vida comum) – estudo da ação moral (do latim mos, moris = lei, regra, comportamento) e social do homem, a Filosofia visa conduzir o homem à prática da reflexão (radical, rigorosa e de conjunto) referente aos fenômenos sociais, políticos, econômicos, culturais, éticos, morais e religiosos existentes em cada época histórica, no intuito de melhor compreendê-los em termos de causas e efeitos.

É essa atitude reflexiva somada às constantes tentativas do homem na busca de encontrar respostas para seus múltiplos questionamentos que constitui, pois, o ato de filosofar, embora as verdades filosóficas obtidas sejam de natureza efêmera. Pelo fato da ação de filosofar requerer do homem o uso de habilidades superiores do pensamento humano, a mesma pode ser definida como um processo-produto, porém sempre inacabado.

É importante e necessário filosofar, uma vez que faz-se preciso transformar o senso comum (que engloba, inclusive, todas as formas possíveis de pensamento mítico) em conhecimento científico, devendo este último estar fundamentalmente pautado na racionalidade, na reflexão crítica, na análise interpretativa e na demonstração/prova científica; tendo como pano de fundo um método de investigação sistemático, lógico, coerente, eficaz e eficiente.

Face ao exposto, cabe-nos, portanto, indagar: qual o papel da Filosofia na escolarização de crianças em idade escolar, na escola de Ensino Médio e nos cursos de formação inicial de professores em geral?

Em linhas gerais, pode-se dizer que na educação escolar de crianças, a Filosofia tem a função precípua de contribuir para o desenvolvimento de valores, tais como respeito, amizade, cooperação, solidariedade, justiça, lealdade, sinceridade, empatia etc.; e também para o despertar sobre a necessidade do estabelecimento de regras de convivência, visando o bem-estar comum dos aprendizes dentro e fora da sala de aula.

Na escola de Ensino Médio, a disciplina de Filosofia, mais do que o resultado de políticas públicas educacionais visando interesses ideológicos, deve promover a criatividade, a atitude ética e moral, o bom senso, o senso crítico, a reflexão, a análise interpretativa e a resiliência (capacidade de o indivíduo responder de forma mais consistente e realista aos desafios e dificuldades existentes na realidade concreta objetiva existencial), tendo em vista o ingresso dos educandos no competitivo mundo do trabalho.

Nos cursos de formação inicial de professores em geral, a Filosofia configura-se, de modo muito particular, como uma disciplina curricular obrigatória, a qual apresenta como objetivo principal favorecer a realização de análises conjunturais e crítico-reflexivas acerca dos problemas educacionais que assolam a escola e o processo ensino-aprendizagem como um todo, a partir de suas relações com a sociedade capitalista, a cultura escolar e a cultura da escola, a ética, a moral, a economia, a política e a religião.

Conhecer um pouco de Filosofia faz-se imprescindível para que os educadores possam, entre outras questões, ser capazes de identificar no projeto político-pedagógico da escola, por exemplo, qual a tendência pedagógica norteadora: liberal (tradicional, renovada progressivista, renovada não diretiva, tecnicista) ou progressista (libertadora, libertária, histórico-crítica/crítico-social dos conteúdos) (LUCKESI, 1991); a teoria curricular subjacente – tradicional, crítica ou pós-crítica (SILVA, 2005); e o tipo de gestão escolar almejada – autocrática, democrática participativa, laissez-faire, burocrática ou carismática (VALERIEN e DIAS, 1993).

Todas essas informações permitem aos docentes, em particular, saber qual é a concepção de mundo, sociedade, homem, cultura, conhecimento, educação, escola, ensino, aprendizagem, professor, aluno, metodologia e avaliação expressas no marco conceitual ou filosófico do projeto pedagógico escolar em termos de diferentes abordagens – comportamentalista, humanista, cognitivista ou sócio-cultural (MIZUKAMI, 1986); as quais demarcam o compromisso político e social da escola para com a sociedade em geral e sua clientela escolar, definindo assim as linhas de ação da instituição de ensino.      

Sem a pretensão de esgotar o assunto em pauta, entendemos que a Filosofia na vida e na escola deve servir de importante ferramenta para que homens, mulheres, jovens, adolescentes, crianças, educadores e educandos possam olhar e compreender o mundo ao seu redor de forma muito mais reflexiva e crítica, sem esquecer que só é possível transformar a sociedade transformando, em primeiro lugar, o “eu” interior, particular, individual de cada pessoa. Nesse sentido, fazemos nossas as palavras do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804), ao dizer que: “Não se ensina Filosofia, ensina-se a filosofar”. Portanto, todos somos “filósofos” e fazemos Filosofia. Filosofemos a respeito!      

Referências  

LUCKESI, C. C. Filosofia da educação. São Paulo: Cortez, 1991. (Coleção Magistério 2º Grau – Série Formação do Professor).

MIZUKAMI, M. G. N. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: EPU, 1986. (Coleção Temas Básicos de Educação e Ensino).

PRADO JÚNIOR, C. O que é filosofia. 7.ed. São Paulo: Brasiliense, 1984. (Coleção Primeiros Passos – v.37).

SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

VALERIEN, J.; DIAS, J. A. Gestão da escola fundamental: subsídios para análise e sugestão de aperfeiçoamento. São Paulo: Cortez, 1993.

 

(*) Marcos Pereira dos Santos é doutorando em Educação, linha de pesquisa “Ensino e Aprendizagem”, pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), escritor, poeta e professor adjunto do Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais (CESCAGE), da Faculdade Sagrada Família (FASF) e do Instituto de Ensino Superior Sant’Ana (IESSA), junto a cursos de graduação (bacharelado/licenciatura) e pós-graduação lato sensu, em Ponta Grossa – Paraná. Endereço eletrônico: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.    

 

A Filosofia tem a função precípua de contribuir para o desenvolvimento de valores

Marcos Pereira dos Santos (*)

Todas as pessoas possuem uma “filosofia de vida”, isto é, um modo particular de pensar-fazer a realidade concreta objetiva existencial; adotando, para tanto, uma postura de neutralidade ou de transformação perante a mesma. 

Como ciência milenar surgida na Grécia antiga, aproximadamente durante o século VI a. C., entre os filósofos gregos chamados “pré-socráticos” (pensadores que antecederam o filósofo grego Sócrates – 469-399 a. C.), a Filosofia (do grego philos = amor, amizade e sophia = saber, sabedoria) configura-se, de acordo com Prado Júnior (1984, p.6), como a “área do conhecimento que tem por objetivo principal efetuar indagações acerca da relação homem-sociedade, buscando assim ampliar incessantemente a compreensão da realidade concreta objetiva existencial para apreendê-la em sua totalidade”.

Estando subdividida em três ramos principais: ontologia – estudo do “ser” ou da existência humana; epistemologia – estudo do conhecimento; e ética (do grego êthos = virtude, caráter, vida comum) – estudo da ação moral (do latim mos, moris = lei, regra, comportamento) e social do homem, a Filosofia visa conduzir o homem à prática da reflexão (radical, rigorosa e de conjunto) referente aos fenômenos sociais, políticos, econômicos, culturais, éticos, morais e religiosos existentes em cada época histórica, no intuito de melhor compreendê-los em termos de causas e efeitos.

É essa atitude reflexiva somada às constantes tentativas do homem na busca de encontrar respostas para seus múltiplos questionamentos que constitui, pois, o ato de filosofar, embora as verdades filosóficas obtidas sejam de natureza efêmera. Pelo fato da ação de filosofar requerer do homem o uso de habilidades superiores do pensamento humano, a mesma pode ser definida como um processo-produto, porém sempre inacabado.

É importante e necessário filosofar, uma vez que faz-se preciso transformar o senso comum (que engloba, inclusive, todas as formas possíveis de pensamento mítico) em conhecimento científico, devendo este último estar fundamentalmente pautado na racionalidade, na reflexão crítica, na análise interpretativa e na demonstração/prova científica; tendo como pano de fundo um método de investigação sistemático, lógico, coerente, eficaz e eficiente.

Face ao exposto, cabe-nos, portanto, indagar: qual o papel da Filosofia na escolarização de crianças em idade escolar, na escola de Ensino Médio e nos cursos de formação inicial de professores em geral?

Em linhas gerais, pode-se dizer que na educação escolar de crianças, a Filosofia tem a função precípua de contribuir para o desenvolvimento de valores, tais como respeito, amizade, cooperação, solidariedade, justiça, lealdade, sinceridade, empatia etc.; e também para o despertar sobre a necessidade do estabelecimento de regras de convivência, visando o bem-estar comum dos aprendizes dentro e fora da sala de aula.

Na escola de Ensino Médio, a disciplina de Filosofia, mais do que o resultado de políticas públicas educacionais visando interesses ideológicos, deve promover a criatividade, a atitude ética e moral, o bom senso, o senso crítico, a reflexão, a análise interpretativa e a resiliência (capacidade de o indivíduo responder de forma mais consistente e realista aos desafios e dificuldades existentes na realidade concreta objetiva existencial), tendo em vista o ingresso dos educandos no competitivo mundo do trabalho.

Nos cursos de formação inicial de professores em geral, a Filosofia configura-se, de modo muito particular, como uma disciplina curricular obrigatória, a qual apresenta como objetivo principal favorecer a realização de análises conjunturais e crítico-reflexivas acerca dos problemas educacionais que assolam a escola e o processo ensino-aprendizagem como um todo, a partir de suas relações com a sociedade capitalista, a cultura escolar e a cultura da escola, a ética, a moral, a economia, a política e a religião.

Conhecer um pouco de Filosofia faz-se imprescindível para que os educadores possam, entre outras questões, ser capazes de identificar no projeto político-pedagógico da escola, por exemplo, qual a tendência pedagógica norteadora: liberal (tradicional, renovada progressivista, renovada não diretiva, tecnicista) ou progressista (libertadora, libertária, histórico-crítica/crítico-social dos conteúdos) (LUCKESI, 1991); a teoria curricular subjacente – tradicional, crítica ou pós-crítica (SILVA, 2005); e o tipo de gestão escolar almejada – autocrática, democrática participativa, laissez-faire, burocrática ou carismática (VALERIEN e DIAS, 1993).

Todas essas informações permitem aos docentes, em particular, saber qual é a concepção de mundo, sociedade, homem, cultura, conhecimento, educação, escola, ensino, aprendizagem, professor, aluno, metodologia e avaliação expressas no marco conceitual ou filosófico do projeto pedagógico escolar em termos de diferentes abordagens – comportamentalista, humanista, cognitivista ou sócio-cultural (MIZUKAMI, 1986); as quais demarcam o compromisso político e social da escola para com a sociedade em geral e sua clientela escolar, definindo assim as linhas de ação da instituição de ensino.      

Sem a pretensão de esgotar o assunto em pauta, entendemos que a Filosofia na vida e na escola deve servir de importante ferramenta para que homens, mulheres, jovens, adolescentes, crianças, educadores e educandos possam olhar e compreender o mundo ao seu redor de forma muito mais reflexiva e crítica, sem esquecer que só é possível transformar a sociedade transformando, em primeiro lugar, o “eu” interior, particular, individual de cada pessoa. Nesse sentido, fazemos nossas as palavras do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804), ao dizer que: “Não se ensina Filosofia, ensina-se a filosofar”. Portanto, todos somos “filósofos” e fazemos Filosofia. Filosofemos a respeito!      

Referências  

LUCKESI, C. C. Filosofia da educação. São Paulo: Cortez, 1991. (Coleção Magistério 2º Grau – Série Formação do Professor).

MIZUKAMI, M. G. N. Ensino: as abordagens do processo. São Paulo: EPU, 1986. (Coleção Temas Básicos de Educação e Ensino).

PRADO JÚNIOR, C. O que é filosofia. 7.ed. São Paulo: Brasiliense, 1984. (Coleção Primeiros Passos – v.37).

SILVA, T. T. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2.ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

VALERIEN, J.; DIAS, J. A. Gestão da escola fundamental: subsídios para análise e sugestão de aperfeiçoamento. São Paulo: Cortez, 1993.

 

(*) Marcos Pereira dos Santos é doutorando em Educação, linha de pesquisa “Ensino e Aprendizagem”, pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), escritor, poeta e professor adjunto do Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais (CESCAGE), da Faculdade Sagrada Família (FASF) e do Instituto de Ensino Superior Sant’Ana (IESSA), junto a cursos de graduação (bacharelado/licenciatura) e pós-graduação lato sensu, em Ponta Grossa – Paraná. Endereço eletrônico: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.    

 

Comentários   

0 # José Manuel Oliveira 13-08-2013 12:51
O maior problema que a humanidade enfrenta agora é o seu futuro.
Dado o estado da mundo comtemporâneo, da globalização e dos direitos humanos, devia ser uma matéria incontornável.

A Republica, Utopia, A Nova Ordem Mundial, O 8º Dia, etc.

O livro O 8º Dia até consegue propor uma solução para acabar com todos os problemas da humanidade.
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