Qualidade do Ensino Superior: os cursos de Administração de Empresas (1ª parte: Diagnóstico)

Um trabalho inédito analisa o nível de preparo dos professores universitários

Este artigo é um resumo do trabalho publicado pelo Professor Flavio Farah (*), que pode ser lido na íntegra, neste link.

800px-StudyingO propósito deste trabalho é analisar a qualidade do ensino superior de um ponto de vista centrado nos cursos de Administração de Empresas. Não é finalidade do presente estudo, porém, focalizar o aluno e suas condições de aprendizagem, mas sim, as condições de ensino, ou seja, o lado do professor.

O fator determinante da qualidade do ensino superior são os métodos e técnicas pedagógicas. Os professores universitários, porém, via de regra, não dominam tais métodos e técnicas. Os motivos dessa deficiência podem ser agrupados nas categorias seguintes.

1. Falta de formação pedagógica

Os professores do ensino superior, via de regra, não possuem formação pedagógica. As razões são as seguintes:

- Embora o ofício de professor universitário seja uma profissão, trata-se de uma profissão não regulamentada. Como consequência, nenhum requisito é imposto ao exercício da docência superior, de modo a garantir a qualidade da formação dos que nela atuam.

- A PGES (Pós-graduação estrito senso) é uma modalidade de educação que seria candidata natural ao encargo de formar professores universitários. Todavia, as imprecisões, omissões e indecisões da LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - Lei nº 9.394/96) colocam esse ramo de ensino em uma posição frágil como formador de docentes para o ensino superior.

- Se, por um lado, a LDB não afirma claramente que os cursos de PGES devem formar professores universitários, por outro lado, a julgar pelas instituições examinadas, a PGES também não forma de fato professores universitários porque sua grade curricular é fraca no tocante às disciplinas pedagógicas.

- Os cursos de pós-graduação lato senso em magistério do ensino superior são outro candidato ao posto de formador de docentes universitários. A amostra examinada desses cursos, porém, sugere que eles possuem natureza exclusivamente teórica. A respectiva metodologia não prevê atividades que façam os estudantes exercitarem a prática docente. Tais cursos, portanto, não permitem a aquisição de habilidades didáticas pelos alunos.

- Para aprovação dos alunos de mestrado ou doutorado, não se exige nenhuma demonstração de proficiência no campo pedagógico.

O artigo 65 da LDB dispõe que a formação docente incluirá prática de ensino de, no mínimo, trezentas horas, exceto para a educação superior. Isso significa que a lei não exige prática de ensino nem qualquer outro requisito pedagógico para a formação de docentes para o ensino universitário.

- Ao avaliar os cursos de PGES, a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) não verifica se eles proporcionam competências pedagógicas aos alunos.

- O § 5º do art. 1º da Resolução CNE/CES nº 1, de 3 de abril de 2001, que estabelece normas para o funcionamento de cursos de pós-graduação, estabelece, como condição indispensável para a autorização de um curso de PGES, a comprovação da prévia existência de grupo de pesquisa consolidado na mesma área de conhecimento do curso. Isso significa que a resolução impede as IES (Instituições de Ensino Superior) de criarem um curso de mestrado ou doutorado exclusivamente para formar professores universitários.

2. Inexistência de um ambiente de aprendizagem nas IES

Os professores universitários não encontram, nas IES, um ambiente de aprendizagem que lhes permita aperfeiçoar sua prática docente, em virtude dos fatores a seguir expostos, próprios das IES privadas.

- Os vínculos entre os docentes e entre estes e a IES são frágeis.

- Mesmo quando contratados no regime celetista, os docentes universitários tendem a ser vistos como profissionais autônomos, o que significa que eles não são vistos como profissionais em desenvolvimento ou a desenvolver, mas sempre como candidatos que, para serem considerados, devem estar “prontos para produzir”.

- A formação pedagógica e as habilidades didáticas dos candidatos a uma vaga no quadro docente da IES não são requisitos para admissão, ou seja, seu mérito como professor não é testado.

- Em razão do baixo percentual recebido a título de hora-atividade, as atividades extra-classe tendem a ser vistas pelo docente como “não compensadoras”.

- Os acréscimos de remuneração do docente dependem exclusivamente de promoção.

- A tendência das IES é não criar programas de aperfeiçoamento para seus professores. Por outro lado, se um docente, por sua própria iniciativa, se inscrever em um programa de treinamento, essa participação não exercerá nenhuma influência na remuneração que ele recebe da instituição onde leciona.

- Via de regra, as IES não possuem processos formais de avaliação de desempenho dos docentes.

- As IES tendem a não recompensar os melhores mestres e a não reconhecer os esforços de desenvolvimento pessoal que seus professores porventura fizerem.

- Os docentes tendem a ser demitidos apenas por razões administrativas (por exemplo, excesso de faltas ou de atrasos) ou se a maioria dos alunos exercer uma pressão insuportável sobre o gestor do curso.

- Nos cursos de Administração, é comum a existência de classes com muitas dezenas de alunos, o que dificulta a utilização de métodos didáticos eficazes.

- Em se tratando do curso de Administração, a estrutura organizacional das IES estimula os professores a assumir um número excessivo de disciplinas de áreas de concentração diferentes. Essa estrutura organizacional também torna difícil que os docentes partilhem suas experiências. Os professores que lecionam uma mesma disciplina tendem a permanecer isolados e a não trocar ideias entre si.

- A atribuição de disciplinas aos professores compete exclusivamente aos gestores de curso. Em geral, não se fixam critérios para decidir quais docentes devem receber quais disciplinas.

- No caso do curso de Administração, é frequente a existência de disciplinas com ementas super-sobrecarregadas, cujo cumprimento afigura-se virtualmente impossível.

- As IES não criam, adquirem, registram ou transferem o conhecimento pedagógico nem usam esse conhecimento para aperfeiçoar as atividades de ensino.

3. Impossibilidade de melhoria autônoma

É difícil aos docentes engajar-se, de forma autônoma, em um processo de melhoria contínua, em virtude dos fatores a seguir expostos.

- Os docentes não sabem que seu ensino é ruim.

- Como nunca foram avaliados, os docentes não iniciantes se sentirão ofendidos com a mera sugestão de aperfeiçoamento e terão grande dificuldade em encarar processos de mudança.

- Mesmo que soubessem que seu ensino é deficiente, os docentes não saberiam o que fazer para melhorar, pois não poderiam contar com o apoio das instituições onde lecionam.

- Os professores universitários não partilham suas experiências e não dispõem da referência de mestres que ministrem ensino de qualidade.

- Muitos docentes universitários lecionam um número elevado de disciplinas diferentes na mesma área de concentração e mesmo disciplinas de diferentes áreas de concentração.

- Os professores não têm consciência de que podem e devem melhorar seus métodos de ensino continuamente.

- Os professores que lecionam em período noturno e exercem outra atividade profissional em período diurno integral não têm tempo nem disposição para revisar conteúdos, métodos e técnicas didáticas.

4. Resultado

O resultado de todos esses fatores é um bloqueio ao aperfeiçoamento dos métodos e técnicas pedagógicas. Assim, a possibilidade de os estudantes dos cursos superiores serem contemplados com um ensino de qualidade dependerá da existência de mestres apaixonados pela docência e que: a) sejam dotados de aptidões pedagógicas inatas que os façam, instintivamente, lançar mão de métodos didáticos eficazes, ou; b) queiram evoluir e que consigam fazê-lo sozinhos apesar de todos os obstáculos que enfrentam.

Para ler este artigo na íntegra, clique neste link.

(*) Flavio Farah é Mestre em Administração de Empresas, Professor Universitário e autor do livro “Ética na gestão de pessoas”. O autor leciona disciplinas como Gestão de Pessoas, Comportamento Organizacional, Relações Humanas e Ética. E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo..

 

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