Segundo o estudo, a divulgação das ações pelas organizações científicas brasileiras são mais intensas do que as dos Estados Unidos, Reino Unido, Itália, Holanda, Alemanha, Portugal e Japão
Por: Elton Alisson | Agência FAPESP
As universidades e instituições de pesquisa brasileiras são frequentemente acusadas de se comunicar pouco com o público em geral, contribuindo para a baixa conscientização de alguns segmentos da sociedade sobre o papel fundamental da ciência para o desenvolvimento econômico e social do país.
Um estudo comparativo internacional sobre a comunicação pública da ciência feita por universidades e instituições de pesquisa, antes da pandemia de COVID-19, mostra, porém, que a intensidade das ações das organizações científicas brasileiras nessa área é maior do que a dos Estados Unidos, Reino Unido, Itália, Holanda, Alemanha, Portugal e Japão.
Os resultados do estudo foram publicados na revista PLOS ONE.
“Vimos que as atividades de divulgação das universidades e instituições de pesquisa desses países são muito semelhantes. O que varia é a intensidade e os investimentos que fazem em comunicação”, diz à Agência FAPESP Marta Entradas, pesquisadora da London School Economics and Political Science (LSE) e coordenadora do estudo.
Os pesquisadores avaliaram a comunicação pública da ciência entre 2017 e 2018 em uma amostra estratificada de mais de 2 mil instituições de pesquisa no Brasil, Alemanha, Itália, Japão, Holanda, Portugal, Reino Unido e Estados Unidos, por meio de questionários. No Brasil, o estudo foi conduzido por pesquisadores vinculados ao Instituto Nacional de Comunicação Pública da Ciência e Tecnologia (INCT-CPCT), sediado na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro.
As análises indicaram que a comunicação pública da ciência ainda está longe de ser totalmente institucionalizada em universidades e instituições de pesquisa nesses países. Mas revelaram também que tem aumentado o compromisso das organizações científicas dessas nações em realizar atividades voltadas a essa finalidade. Mais da metade das universidades e instituições de pesquisa (61%) responderam ter promovido nos últimos cinco anos palestras e debates públicos, além de atividades voltadas a escolas, semanas de ciência ou respondido a solicitações da imprensa por entrevistas, entre outras ações, com a participação de seus pesquisadores. Quase 65% disseram que conduzem atividades de comunicação para o público não acadêmico há mais de cinco anos.
Algumas das principais razões apontadas pelas universidades e instituições de pesquisa para intensificar ações de comunicação pública da ciência são, predominantemente, divulgar os resultados das pesquisas para o público em geral, cumprir uma das missões dessas organizações – dar visibilidade aos seus projetos – e obter o apoio da sociedade para suas atividades.
Para realizar suas ações de comunicação quatro em cada dez organizações de pesquisa empregam profissionais de comunicação e metade conta com departamentos de comunicação próprios ou agências de relações públicas.
“Nossos dados mostram que têm ocorrido mudanças na cultura de comunicação pública da ciência ao longo da última década”, afirma Entradas.
“Isso não quer dizer que essas organizações de pesquisa não fizessem essa atividade no passado. Mas observamos que a comunicação de ciência por parte dessas instituições tem se profissionalizado”, afirma.
Baixo financiamento
De modo geral, os meios de comunicação tradicionais, como os jornais, rádios e a televisão, são os canais mais usados pelas universidades e instituições de pesquisa dos países analisados para divulgar suas ações. As mídias sociais têm participação marginal e são mais exploradas pelas organizações de pesquisa com equipe de profissionais.
A prática de comunicação das instituições reflete as preferências do público interessado em ciência, apontam os autores do estudo. Em todos os países pesquisados, a maioria das pessoas ainda obtém notícias sobre ciência por meio da mídia tradicional. As redes sociais desempenhavam um papel menor como fonte de informação sobre o assunto – o estudo foi realizado entre 2017 e 2018. Na Europa, por exemplo, 65% dos cidadãos obtêm informações científicas por meio da televisão e 10% por meio das redes sociais ou blogs.
Em países como a Alemanha, as mídias sociais também não têm grande repercussão, especialmente entre a população mais instruída, incluindo os cientistas, que as consideram como “playground de teóricos da conspiração” ou um lugar onde “pequenas comunidades constantemente confirmam seus próprios preconceitos em bolhas amplamente fechadas”. Além disso, muitos cientistas consideram não ser possível transmitir a complexidade dos resultados de suas pesquisas em posts curtos.
“O uso de mídia social para se comunicar com o grande público foi considerado baixo entre os cientistas, independentemente da disciplina”, destacam os autores.
O volume de recursos disponibilizados pelas universidades e instituições de pesquisa para ações de comunicação pública da ciência também ainda é baixo. Em média, as organizações de pesquisa responderam que gastam cerca de 3% de seu orçamento anual de pesquisa nessa atividade.
“A disponibilidade de recursos e a existência de uma política de ciência são os fatores que exercem maior efeito nos esforços de comunicação pública das universidades e instituições de pesquisa”, diz Entradas.
Os pesquisadores pretendem avaliar, agora, o tipo de conteúdo disseminado pelas universidades e instituições de pesquisa em suas ações de comunicação pública da ciência e avaliar o impacto na sociedade. Além disso, pretendem concluir a análise de mais dois países também participantes do estudo – a China e Taiwan.
“Vamos focar em questões mais específicas sobre, como o conteúdo e as estratégias de divulgação empregados pelas instituições de pesquisa desses países. Isso será feito nos próximos três anos”, afirma Entradas.
O artigo Public communication by research institutes compared across countries and sciences: Building capacity for engagement or competing for visibility (DOI: 10.1371/journal.pone.0235191), de Marta Entradas, Martin W. Bauer, Colm O'Muircheartaigh, Frank Marcinkowski, Asako Okamura, Giuseppe Pellegrini, John Besley, Luisa Massarani, Pedro Russo, Anthony Dudo, Barbara Saracino, Carla Silva, Kei Kano, Luis Amorim, Massimiano Bucchi, Ahmet Suerdem, Tatsuo Oyama e Yuh-Yuh Li, pode ser lido na revista PLOS ONE em https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0235191.
Este texto foi originalmente publicado por Agência FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.